Para Pierre Bourdie, "toda arte é, de alguma maneira, feita duas vezes. Pelo criador e pelo espectador, ou melhor, pela sociedade à qual pertence o espectador, e em sua situação cultural específica". Portanto, ao se discutir a formação do profissional da educação, pedagogia e o ato pedagógico como arte ou como ciência, considero fundamental refletir sobre a possibilidade de reconhecer docência como arte sem, contudo colocar-lhe em um lugar menor. E mais, a docência constitui-se ao longo do tempo em um campo científico importante para compreensão do próprio ato pedagógico. Além disso, a docência como arte não deve ser entendida como diversa "do resultado da atividade humana, do esforço criador e re-criador do homem, de seu trabalho por transformar e estabelecer relações dialogais com outros homens", como afirmou Paulo Freire .Ela precisa ser abordada em sua rede de relações. Portanto, no que tange à formação do profissional da educação e a pedagogia não é possível tecer uma concepção prudente se considerarmos arte e ciência conceitos contrários. Estes dois conceitos se entrelaçam e se complementam em um movimento contínuo e complexo e, embora guardem as suas diferenças epistemológicas podem estar presentes e constituir o mesmo processo, neste caso, a docência.
É importante considerar que o saber dos professores é um saber social e está relacionado com a pessoa e a identidade dele; com sua experiência de vida; com sua história profissional; com suas relações com os alunos em sala de aula; e com outros atores sociais. Ele é social, porque é partilhado por um grupo de agentes professores, que possuem uma formação comum; trabalham numa mesma escola; e, por causa da estrutura deste “campo”, estão sujeitos a representações coletivas e a situações coletivas de trabalho. Outra razão é que o que o professor ensina, e como ensina, evolui com o tempo e as mudanças sociais; ou seja, o saber do professor é incorporado, modificado, adaptado em função dos momentos de sua carreira, ao longo de sua trajetória profissional. Na perspectiva de Tardif, o saber do professor está situado na interface entre o individual e o social, entre o ator e a estrutura. Nesse sentido, destaco que o sujeito-professor é um agente social, fruto das interações estabelecidas entre o(s) campo(s) social (is) de que participa e sua subjetividade. Sendo assim, é importante que o professor seja reconhecido como um sujeito sociocultural que constrói e reconstrói seus conhecimentos conforme as necessidades e demandas do contexto histórico e social, suas experiências, seus percursos formativos e profissionais.
Considero, portanto que os saberes da experiência são saberes-práticos e formam um conjunto de representações a partir das quais os professores interpretam, compreendem e orientam sua formação e sua prática cotidiana. Na medida em que o professor enfrenta dificuldades e interage com os campos: social, profissional e escolar, ele utiliza, amplia e modifica o seu habitus. O trabalho docente é uma atividade exercida em interação com outros sujeitos, no campo escolar, que é constituído por relações sociais hierárquicas. As experiências adquiridas nas interações vão sendo articuladas com o aprendizado passado e vão se constituindo numa nova matriz geradora de saberes, que orienta a prática docente, conforme pode ser constatado por Bourdieu, quando diz que “o conhecimento prático é uma operação de construção que aciona sistemas de classificação que organizam a percepção e a apreciação, e estruturam a prática”. A prática profissional do professor está associada aos saberes construídos e incorporados ao longo da trajetória pessoal e profissional. Ao longo da trajetória, o professor vai incorporando os saberes sobre como ensinar, sobre as imagens e papeis de professor, sobre crenças e certezas sobre a prática. Portanto, pode-se considerar que o desenvolvimento profissional é um processo de crescimento pessoal; de aquisição de competências de eficácia de ensino e organização do processo ensino-aprendizagem; e a adaptação do professor ao meio profissional e à instituição escolar. Isso ocorre mediante as relações entre os campos sociais e o agente, num processo contínuo de adaptações e/ou transformações.
_________________Escritos sobre a educação. (Org.). NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio. Petrópolis: Vozes, 1998.
________________. O poder simbólico tradução Fernando Tomaz (português de Portugal) – 7ª ed. – Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2004.
TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.
Por Profª Ericka Cunha
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